No âmbito federal, as restituições, ressarcimentos e compensações de tributos, como regra, são operacionalizadas por meio do programa PER/DCOMP. Neste programa, o contribuinte informa os créditos tributários dos quais deseja ser restituído ou ressarcido, bem como pode declarar compensações com débitos tributários vencidos ou vincendos.
Uma vez transmitida a declaração, a Receita Federal analisa o pedido, podendo deferi-lo, de forma tácita ou expressa, ou indeferi-lo. No caso de indeferimento, o contribuinte tem o direito de apresentar manifestação de inconformidade, a qual instaurará o contencioso administrativo. A defesa apresentada será julgada primeiramente por uma Delegacia da Receita Federal de Julgamento (DRJ) e, a depender da hipótese, será julgada em segunda e última instância administrativa pelo Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF).
No caso de pedido de restituição ou ressarcimento, a negativa da Receita Federal implica, por consequência lógica, na não devolução do crédito tributário pleiteado pelo contribuinte. Já no caso de compensação, a negativa ao pedido acaba por gerar automaticamente uma cobrança em face do contribuinte, já que o débito objeto da compensação voltará à condição de exigível com o acréscimo de juros e multa moratória (limitada a 20%), como se o tributo não tivesse sido pago tempestivamente.
É claro que a apresentação de manifestação de inconformidade pelo contribuinte suspenderá a exigibilidade do débito gerado até o final do processo administrativo, o que lhe garantirá, por este período, a devida regularidade fiscal, com a possibilidade de emissão de Certidão Positiva com Efeitos de Negativa (CPEND), a qual, nos termos do Código Tributário Nacional, tem os mesmos efeitos que a CND.
Ocorre que, com o objetivo geral de evitar fraudes, a legislação sobre a matéria há muito tempo foi alterada para fazer constar a aplicação de multa de 50% sobre o valor do crédito objeto de pedido de ressarcimento indeferido pela Receita Federal.
Após, a legislação foi novamente alterada (art. 74, §15, da Lei nº 9.430/96) para estender a aplicação da multa também para o valor do crédito objeto de compensação não homologada pela Receita Federal.
Ou seja, a legislação atualmente em vigor penaliza indiscriminadamente os contribuintes que têm o seu pedido de ressarcimento ou compensação indeferidos pela Receita Federal, já que a multa é devida só pela negativa, não sendo necessária qualquer comprovação pela Receita Federal quanto a ocorrência de fraude ou má-fé no pedido do contribuinte.
No caso de pedido de compensação o problema é ainda maior, já que o contribuinte é duplamente penalizado. Isso pois, como dito acima, a não homologação da compensação implica na cobrança do débito compensado com o acréscimo de juros e multa de mora (de 20%). É dizer, nessa hipótese, o contribuinte passa a ser devedor de duas multas: a de mora (de 20%) e a punitiva (de 50%), ambas calculadas sobre o valor do débito compensado e não homologado.
A questão foi então levada à apreciação pelo Supremo Tribunal Federal, que, na semana passada (sessão de 10/03/2023 a 17/03/2023), julgou inconstitucional, por unanimidade de votos, a cobrança da multa punitiva de 50% prevista no art. 74 da Lei nº 9.430/96. Os julgamentos ocorreram no bojo do RE nº 796.939, de relatoria do Min. Edson Fachin, e na ADI nº 4.905, de relatoria do Min. Gilmar Mendes.
Apenas o Min. Alexandre de Moraes fez uma ressalva em seu voto no sentido de permitir a aplicação da multa nos casos de comprovada falsidade, dolo ou má-fé do contribuinte no pedido de ressarcimento ou de compensação.
Ao final dos julgamentos, foi proposta a seguinte tese (Tema nº 736): É inconstitucional a multa isolada prevista em lei para incidir diante da mera negativa de homologação de compensação tributária por não consistir em ato ilícito com aptidão para propiciar automática penalidade pecuniária.
Aponta-se que a decisão do STF não transitou em julgado e ainda pode ser objeto de recursos por parte da Fazenda Nacional, especialmente via embargos de declaração. Porém, o mérito da decisão não será alterado.
Por ter efeitos para todos (erga omnes) e por não ter havido modulação dos efeitos, a decisão deverá ser replicada a todos os processos administrativos ou judiciais em andamento que tratem desta matéria.
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