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MP 1.171/23 AUMENTA FAIXA DE ISENÇÃO DO IRPF E REGULA TRIBUTAÇÃO DE ATIVOS E RENDIMENTOS NO EXTERIOR



No último domingo, dia 30/04/2023, foi publicada a MP nº 1.171/23, a qual trouxe importantes mudanças no cenário tributário, notadamente: a) o aumento da faixa de isenção do IRPF; b) a regulamentação da tributação de ativos financeiros e rendimentos de capital aplicados diretamente por pessoas físicas no exterior; c) regulamentação da tributação de offshores e trusts no exterior; e d) a implementação de opção para atualização do valor de bens e direitos no exterior para o valor de mercado.


A Medida Provisória entrou em vigor em 01/05/2023, porém, grande parte das mudanças terá efeitos apenas a partir de 01/01/2024. Aponta-se também que por ser uma Medida Provisória, as suas disposições dependerão do aval do Congresso Nacional para serem definitivamente convertidas em lei, no prazo de 120 dias.


1) Aumento da faixa de isenção do IRPF


A primeira grande mudança trazida pela MP nº 1.171/23 e que impactará positivamente a maior parte da população foi o aumento da faixa de isenção do IRPF. Até então, só quem recebia até R$ 1.903,98 mensais estava isento do imposto, contudo, a partir do mês de maio de 2023, a faixa de isenção mensal passará a ser de R$ 2.112,00.


Embora as demais faixas do IRPF tenham sido mantidas, o aumento da primeira faixa (faixa de isenção) impactará de forma favorável também na apuração do IRPF por pessoas que recebam quantias superiores a esta, dado que o cálculo do IRPF nas faixas superiores é feito com base no valor que exceder a faixa de isenção.


Além disso, a MP permite a substituição das deduções no IR retido na fonte mensalmente (por exemplo, pensão alimentícia, dependentes, contribuições previdenciárias etc.) por uma dedução simplificada correspondente a 25% do limite da faixa de isenção, isto é, uma dedução simplificada de R$ 528 em relação ao imposto devido no mês, sem necessidade de comprovar despesas à Receita Federal.


Basicamente, isso quer dizer que, por exemplo, uma pessoa que receba em um mês até R$ 2.640,00 também poderá estar isenta do imposto, vez que com a dedução simplificada de 25% a base de cálculo do IR desta pessoa será reduzida para dentro do limite da isenção.


2) Da tributação de ativos financeiros e rendimentos de capital no exterior


A MP traz nova regra fiscal a qual impõe que, a partir de 01/01/2024, a renda e rendimentos auferidos por pessoas físicas residentes no Brasil em aplicações financeiras, entidades controladas (offshores) e trusts no exterior sejam tributados pelo IRPF.


Como regra, os rendimentos oriundos de tais investimentos estrangeiros ficarão sujeitos à incidência do IRPF, no ajuste anual, não se aplicando nenhuma dedução da base de cálculo, à alíquota de 15% sobre a parcela anual dos rendimentos que exceder a R$ 6.000,00 e 22,5% sobre a parcela que ultrapassar R$ 50.000,00.


A principal intenção da medida, tal como afirmado pelo próprio Governo Federal, é acabar com o diferimento/postergação do pagamento do IR devido em operações efetuadas por intermédio de offshores e trusts.


Isso pois, os trusts não possuíam previsão tributária específica no Brasil, o que beneficiava o não recolhimento do IR nestas operações, e, por sua vez, os rendimentos oriundos de offshores sofriam tributação apenas quando da disponibilização ou distribuição de seus lucros aos acionistas pessoas físicas residentes no Brasil.


Nesse contexto, é bastante comum que os lucros apurados em offshores, normalmente sediadas em paraísos fiscais ou em países com tributação favorecida, não sejam imediatamente distribuídos aos sócios com o intuito de postergar ao máximo a tributação pelo IRPF no Brasil.


De modo a contornar essa questão, a partir de agora, os lucros e rendimentos de offshores serão tributados ano a ano na DIRPF, isto é, no ano em que forem apurados em balanço, independentemente de haver ou não a sua efetiva distribuição à pessoa física residente no Brasil, tal como mais bem detalhado a seguir.


3) Da tributação de investimentos diretos em aplicações financeiras no exterior


Embora os respectivos rendimentos estejam submetidos à mesma regra de tributação prevista (isto é, tributação pelo IRPF à alíquotas de 15% ou 22,50%), a MP separa os investimentos estrangeiros em três grupos: (i) investimentos diretos de pessoas físicas em aplicações financeiras no exterior; (ii) investimentos por intermédio de offshores; e (iii) investimentos em trusts.


De acordo com a MP, consideram-se aplicações financeiras: os depósitos bancários; certificados de depósitos; cotas de fundos de investimento; instrumentos financeiros; apólices de seguro; certificados de investimento ou operações de capitalização; depósitos em cartões de crédito; fundos de aposentadoria ou pensão; títulos de renda fixa e de renda variável; derivativos e participações societárias, com exceção daquelas tratadas como entidades controladas no exterior; dentre outros.


Os rendimentos auferidos no exterior em decorrência destas aplicações financeiras (tais como, juros, prêmios, comissões, ágio, lucros, dividendos etc.) serão computados na DIRPF e submetidos à incidência do IRPF no período de apuração em que forem efetivamente percebidos pela pessoa física, no resgate, na amortização, na alienação, no vencimento ou na liquidação das aplicações financeiras.


Por fim, destaca-se que os ganhos de capital percebidos pela pessoa física residente no Brasil na alienação, na baixa ou na liquidação de bens e direitos localizados no exterior que não constituam aplicações financeiras nos termos da MP permanecerão sujeitos às regras específicas de tributação dispostas na legislação (isto é, a tributação progressiva do ganho de capital em alíquotas que variam entre 15%, 17,5%, 20% e 22,5%).


4) Da tributação das offshores


Os lucros apurados a partir de 01/01/2024 por offshores controladas por pessoas físicas residentes no País serão tributados em 31/12 de cada ano, nos exatos termos do previsto acima.


Serão consideradas como controladas as sociedades e as demais entidades, personificadas ou não, incluindo fundos de investimento e fundações, em que a pessoa física detiver, de forma direta ou indireta, isoladamente ou em conjunto com outras partes direitos que lhe assegurem preponderância nas deliberações sociais ou poder de eleger ou destituir a maioria dos seus administradores.


Considera-se controlada também as sociedades ou entidades em que a pessoa física detiver ou que possuir, direta ou indiretamente, isoladamente ou em conjunto com pessoas vinculadas, mais de 50% de participação no capital social, ou equivalente, ou nos direitos à percepção de seus lucros, ou ao recebimento de seus ativos na hipótese de sua liquidação.


Sujeitam-se a este novo regime tributário somente as offshores que se enquadrarem em uma ou mais das seguintes hipóteses: (i) estejam localizadas em país ou dependência com tributação favorecida (paraísos fiscais) ou sejam beneficiárias de regime fiscal privilegiado; ou (ii) que apurem renda ativa própria inferior a 80% da renda total. Por renda ativa, entende-se a renda da atividade econômica própria da offshore, excluindo as chamadas “rendas passivas”, como aquelas com juros e dividendos.


Os lucros das offshores deverão ser apurados de forma individualizada em balanço anual elaborado com observância aos princípios contábeis, de acordo com o disposto na legislação. Os lucros deverão ser convertidos em moeda nacional pela cotação de fechamento do dólar americano divulgada, para venda, pelo BACEN, para o último dia útil do mês de dezembro de cada ano.


Esses lucros serão então computados na DIRPF, em 31/12 do ano em que forem apurados no balanço, independentemente de qualquer deliberação acerca da sua distribuição, na proporção da participação da pessoa física no capital social, ou equivalente, da controlada no exterior, e submetidos à incidência do IRPF no respectivo período de apuração.


Os lucros também deverão ser incluídos na ficha de bens e direitos, como custo de aquisição adicional do investimento e, quando distribuídos para a pessoa física controladora, reduzirão o custo de aquisição do investimento e não serão tributados novamente.


Poderão ser deduzidos do lucro da offshore os prejuízos apurados em balanço, pela própria offshore, desde que referentes a períodos posteriores à data de produção de efeitos da MP (isto é, 01/05/2023) e anteriores à data da apuração dos lucros. Também poderá ser deduzido do lucro da offshore a parcela correspondente aos lucros e dividendos de suas investidas que sejam pessoas jurídicas domiciliadas no Brasil.


Por seu turno, quando da determinação do IRPF devido, a pessoa física poderá deduzir, na proporção de sua participação no capital social, ou equivalente, o imposto sobre a renda pago no exterior pela offshore e suas investidas, incidente sobre o lucro computado na base de cálculo do IRPF, até o limite do imposto devido no Brasil.


Assim, temos que, a partir de 01/01/2024, os lucros de offshores localizadas em paraísos fiscais ou que sejam beneficiárias de regime fiscal privilegiado, bem como as que apurem renda ativa própria inferior a 80% da renda total, serão tributados anualmente (com base nas alíquotas de 15% ou 22,5%) tão logo sejam apurados em balanço, independentemente de serem distribuídos/disponibilizados às pessoas físicas no Brasil.


Por sua vez, offshores que não se enquadrem nas hipóteses acima permanecerão sujeitas à regra atual, a qual impõe a tributação pelo IRPF somente quando da efetiva disponibilização/distribuição do lucro ao beneficiário pessoa física no Brasil.


Por fim, aponta-se que a variação cambial do principal aplicado em qualquer tipo de offshore comporá o ganho de capital percebido pela pessoa física no momento da alienação, da baixa ou da liquidação do investimento, inclusive por meio de devolução de capital.


5) Da tributação de trusts pelo IRPF


O trust é uma figura jurídica que não encontra disciplina própria no ordenamento brasileiro. Basicamente, por meio desta estrutura, o instituidor do trust (settlor) transfere bens e direitos que irão compor o trust, a ser administrado por um terceiro (trustee).


Os bens e direitos depositados no trust, assim como os seus rendimentos, serão transferidos aos beneficiários do trust, que podem ser o próprio instituidor (settlor) e/ou terceiros, tudo de acordo com o que estiver previsto no contrato de instituição do trust (trust deed e/ou letter of wishes).


Por inexistir previsão legal específica, há algum tempo se discute a forma de tributação dessas operações com trusts mantidos no exterior. Em 2020 a Receita Federal havia se manifestado positivamente à tributação pelo IRPF sobre rendimentos oriundos de trust aberto no exterior, vide Solução de Consulta COSIT nº 41/2020.


Embora, a rigor, a mencionada Solução de Consulta produzisse efeitos vinculantes para todos os contribuintes que recebessem rendimentos de trust no exterior, a questão ainda estava totalmente em aberto justamente ante a ausência de legislação específica.


Vale apontar que a discussão atinge também os interesses dos Estados e DF, que há algum tempo buscam tributar esses ativos no exterior por meio do ITCMD. No Estado de São Paulo foi publicada a Resposta à Consulta nº 25334/2022 na qual se conclui que a transferência dos bens e direitos do instituidor (settlor) para serem administrados pelo trustee e posterior repasse aos beneficiários configuraria doação tributável pelo ITCMD.


Nesse contexto, a MP nº 1.171/23 trouxe disciplina específica à matéria. De acordo com a MP, os rendimentos e ganhos de capital relativos aos bens e direitos objeto do trust auferidos a partir de 01/01/2024 serão considerados auferidos pelo titular de tais bens e direitos na respectiva data e submetidos à incidência do IRPF segundo as regras aplicáveis ao titular.


De acordo com a MP, considera-se titular do trust, para fins de tributação, o próprio instituidor (settlor) ou os beneficiários do trust. Os beneficiários passam a ser titulares do trust, para fins fiscais, na hipótese de efetiva transferência dos bens e direitos objeto do trust a eles ou quando do falecimento do instituidor (settlor), o que ocorrer primeiro.


Nesse sentido, os bens e direitos objeto do trust, independentemente da data da sua aquisição, deverão, a partir de 01/01/2024, em relação à data-base de 31/12/2023, ser declarados diretamente pelo titular na DIRPF, pelo custo de aquisição.


Caso o titular tenha informado anteriormente o trust em suas declarações, o trust deverá ser substituído pelos bens e direitos subjacentes, alocando-se o custo de aquisição para cada um desses bens e direitos, considerando a proporção do valor de cada bem ou direito frente ao valor total do patrimônio objeto do trust.


Ainda, a MP abre espaço legal para que os Estados e DF exijam ITCMD sobre a transferência dos bens e direitos do trust aos beneficiários. Isso pois, conforme a Medida, a distribuição dos bens e direitos pelo trust, a partir de 01/01/2024, possuirá natureza jurídica de transmissão a título gratuito pelo instituidor para o beneficiário, consistindo em doação, se ocorrida durante a vida do instituidor, ou transmissão causa mortis, se decorrente do falecimento do instituidor (settlor).


6) Da atualização do valor de bens e direitos no exterior para o valor de mercado


Outra novidade trazida pela MP é a possibilidade de que a pessoa física residente no País atualize em sua DIRPF o valor de bens e direitos que detiver no exterior para o valor de mercado. A diferença positiva calculada entre o valor anteriormente declarado na DIRPF e o valor de mercado do bem ou direito será tributada à alíquota de 10%.


Essa opção será aplicada a aplicações financeiras; bens imóveis em geral ou ativos que representem direitos sobre bens imóveis; veículos, aeronaves, embarcações e demais bens móveis sujeitos a registro em geral, ainda que em alienação fiduciária; e participações em offshores. Ademais, o contribuinte poderá optar, inclusive, pela atualização do valor de bens e direitos objeto de trust em relação aos quais a pessoa física seja definida como titular.


Para efeitos de atualização, as pessoas físicas deverão levar em consideração: (i) para as aplicações financeiras, o saldo existente na data-base, conforme documento disponibilizado pela instituição financeira custodiante; (ii) para os bens imóveis e móveis, o valor de mercado na data-base conforme avaliação feita por entidade especializada; e (iii) para as participações em offshores, o valor do patrimônio líquido proporcional à participação no capital social, ou equivalente, conforme demonstrações financeiras preparadas com observância aos princípios contábeis do Brasil, com suporte em documentação hábil e idônea, incluindo a identificação do capital social, ou equivalente, reserva de capital, lucros acumulados e reservas de lucros.


O valor expresso em moeda estrangeira será convertido em dólares americanos, pela cotação divulgada, para venda, pelo BACEN, para o último dia útil do ano-calendário de referência de atualização; e em moeda nacional, pela cotação de fechamento do dólar americano divulgada, para venda, pelo BACEN, para o último dia útil do ano-calendário de referência de atualização.


Os saldos tributados (isto é, a diferença positiva resultante da atualização a valor de mercado) serão considerados como acréscimo patrimonial na data em que houver o pagamento do imposto e deverão ser incluídos na ficha de bens e direitos da DIRPF. E, no caso de offshores, quando forem disponibilizados para a pessoa física controladora, reduzirão o custo de aquisição do investimento e não serão tributados novamente.


A opção poderá ser exercida em conjunto ou separadamente para cada bem ou direito no exterior. O imposto deverá ser pago até 30/11/2023 e deverá seguir as condições e prazos a serem estabelecidos pela Receita Federal.


Destaca-se que não poderão ser objeto de atualização os bens ou direitos que não tiverem sido declarados na DIRPF relativa ao ano-calendário de 2022 e as joias, pedras e metais preciosos, obras de arte, antiguidades de valor histórico ou arqueológico, animais de estimação ou esportivos e material genético de reprodução animal, sujeitos a registro em geral, ainda que em alienação fiduciária.


A opção de que trata este artigo somente se consumará e se tornará definitiva com o pagamento integral do imposto. Não poderão ser aplicados quaisquer deduções, percentuais ou fatores de redução à base de cálculo, à alíquota ou ao montante devido do imposto.


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